quarta-feira, 25 de junho de 2008

Tsuru

Eu juro que eu não fiz nada dessa vez... eu pedi mentalmente, enquanto descia as escadas rolantes da estação Jabaquara do metrô sentido Tucuruvi, para que alguma outra alminha conversasse com a minha...

Foi rápido assim, questão de milésimos de segundos, sem muita ênfase e pretensão que me peguei solicitando aos anjinhos mais um grande encontro transcendental – visto que já tinha me divertido com a história da Dona Jaira e do Sr. Alberto no mundo subterrâneo (vide texto já publicado)...

Bom, fui eu até o centro da cidade, gastei horas por lá, comi abacaxi no saquinho sobre o gelo, agradeci aquela muvuca que eu só encontrei, por enquanto, nessa terra aqui e voltei, fisicamente exausta, no primeiro vagão sentadinha de costas pra direção que ia o metrô de volta pra casa.

Passaram-se algumas estações, eu lendo minha revista, de pernas cruzadas, minha bolsa simplesmente grudada no meu corpo e um metrô que perambulava tranqüilo de gente...

Eu lá quietinha, concentradinha na matéria que eu lia e totalmente esquecida do que eu havia pedido há +-6 horas atrás... Na minha frente um senhourzinho JAPINHA, magrinho, careca, de óclinhos quadrado ½ fundo de garrafa, calça de tergal cinza, de sorriso estampado no rosto e uma tranqüilidade zen oriental:

- “Isso é pra você, minha jovem.” - me estendeu a sua mão e me presenteou com um Origami em formato de um pássaro.


Do olhar na matéria direcionei ao seu e, num japonês “muito obrigado” básico, respondi:

- “Domo Arigatô.” – e curvei sutilmente minha cabeça para complementar tal agradecimento.

Ali eu já estava totalmente ciente de que tudo aquilo era o reflexo daquele despretensioso pedido feito na escadaria inicial da estação do metrô... Já estava totalmente agradecida pela conexão das almas até então “desconhecidas”... E totalmente com pressa de dizer para aquele Japinha que eu também era uma ½ JAPINHA!

- “Vc sabe como chama esse pássaro em japonês?”, ele me perguntou.

- “Não sei não.”

- “Tsuru.”

- “Pode repetir para eu gravar bem?” (sou visual e preparei meu bloquinho mental e meu dedo indicador)

- “Tsuru.”

- “T-su-ru... Arigatô. Muito gentil. Minha mãe também é Japinha. Eu não falo japonês.”

- “Mãe japonês?”

- “Sim, Satiko San

- “E o Sr. como se chama?”

Ele disse o nome só que eu não pedi para repetir dessa vez... me esqueci... Só que para mim ele é o Japinha Tsuru que me presenteou. E se não bastasse um, tirou um outro Origami Tsuru da sua carteira, branquinho, diferente daquele laranja.

Agradecidos e merecidos.

A porta do vagão mais uma vez se abriu, o Japinha se foi e eu fiquei com os 2 passarinhos, serena e com a certeza de PRESTAR MUITA ATENÇÃO PARA O QUE SE PEDE PRA VIDA: POIS A VIDA DÁ!

Né?

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Sabão em pó

Às análises dos fatos:

- era a minha primeira semana dividindo o apartamento;
- o apê era no 4. andar e não tinha elevador;
- eu estudava de manhã e a menina que dividia o quarto comigo (“Alitche”) trabalhava num bar e chegava às 4am;
- eu não falava italiano;
- ela (Alice) só falava italiano;
- eu tinha o sorriso simpático de uma brasileira empolgada recém-chegada naquela terrinha;
- ela P. da vida de juntar o seu quebra-cabecinha imaturo italiano generalizado: brasileiraétudosafada, temumaaquisorrindopramim, naminhacasa, naminhaterra, quenãofalaumapalavraemitaliano.

Como o no$$o porquinho ainda não nos dava ao luxo de ter uma lavadora-de-roupas dentro do banheiro (ter lavanderia é coisa de país largo, grande, espaçoso), juntei 5 ou 6 dias de roupa suja e todos os produtos necessários para a minha primeira lavagem self-service de roupas: amaciante, sabão em pó liquido e moedinha € para eu trocar por fichinha.

Era setembro. Solzinho gostoso e Milão ainda quietinha naquelas primeiras 7.30 horas do dia. E graças ao Dio lá que a lavanderia era embaixo do meu prédio...

Entrei no recinto, me surpreendi com a falta de um “bom dia humano” e vi que o único calor que poderia vir era do trambolho da máquina de secar que tava lá no fundo a esquerda...

Segui direitinho as instruções. Escolhi a máquina de lavar do meio, coloquei os produtos, travei a porta frontal, coloquei a fichinha e nada da queridinha funcionar...

Esperei + alguns minutos e nada! Com o coração mais acelerado já sentia, via e não queria acreditar que a maledeta máquina não ia girar não...

E o que fazer? – perguntei para os tufos cinzas (conglomerado de pêlo de cobertor, fiapo de toalha e cabelo) espalhados pelo chão... Ligar por número que estava pregado na parede para ser usado nos casos de emergência? Mas como explicaria que a máquina (como é máquina-de-lavar-roupas em italiano?) tava quebrada? que não funcionava? pelo telefone? – mímica era impossível...

Mas respirei fundo. Pensei bem e achei a mais perto solução do meu maior problema: a mocinha que só tinha dormido umas 3 horas e que ainda tinha o pré-conceito: brasileiraétudosemvergonha, temumaaquipertodemim, comduplacidadania, naminhaterra, meacordando, quenãofalaumapalavraemitaliano.

E subi pra casa. Peguei meu dicionário e fui lá dar um cutucãozinho na ragazza:

- “Lice” (eu achando q ser íntima amenizaria toda a situação)
Lice, Lice: lavatrice – e busquei a outra página: rota

Ela girou para o outro lado e disse:

- “Non mi rompere il coglione”

Até eu, que não entendia italiano, entendi tudo! E o “num me enche o saco” dito em letras garrafais às 8 da manha foi como uma facada certeira no meu coração, uma fungada de choro preso na garganta e meu problema sem solução.

Fui pra cozinha, sentei, escorreu uma lágrima e enquanto tentava achar uma outra alternativa eis que a porta se abre:

- “ANDIAMO!”

Pulei da cadeira! Não contive meu sorrisosemvergonhadebrasileirafelizzzdenovo e descemos para resolver meu probleminha...

Minha heroína era uma pirralha de 1.55m! Que ligou pro tal numero emergência, xingou um monte o cara do outro lado e literalmente lavou a roupa suja.

Só que para finalizar aquela manhã toda ensaboada do que viria a ser uma grande amizade (italianassãobemmaismalandrasqueasbrasileiras) eu vejo um dedinho indicador apontado para minha cara e um desabafo que instantaneamente eu traduzi:

- “Nunca mais me acorde às 8 horas da manhã”

Eu monossilábica respondia:

- “si si, grazie grazie mille”

E com o passar dos meses lavei e centrifuguei mais uma superstição de um monte de italianinha que hoje sabem que existem brasileirasEbrasileirasdesimpatiageral...